Entre as recentes leituras que mais me encantaram está a biografia do feirense Divaldo Pereira Franco, escrita pela jornalista Ana Landi.
Pelo que me recordo, tenho contato com o espiritismo desde os meus 10 anos de idade, quando participava do “Culto no Lar”, que minha mãe fazia em nossa casa, ou quando eu a acompanhava ao Centro Espírita União Feirense. Desde esse tempo, alguns nomes me eram marcantes. E Divaldo Franco era um dos principais, junto aos de Chico Xavier, Bezerra de Menezes, Zibia Gasparetto e Vera Lúcia Marinzeck. Também por isso, escrever sobre ele é, para mim, um grande prazer. E uma imensa ousadia, por não estar a minha escrita à sua altura. Mas peço mental licença e lá vou eu.
Na Feira de Santana de 1927, a do mercado de gado e dos tropeiros, viveram Ana Alves Franco e Francisco Pereira Franco. Dona Ana, aos 44 anos, foi ao médico buscar solução para uma suposta “barriga d’água”. A informação de sua gravidez veio junto com um pedido de aborto, feito pelo médico, que identificava ali problemas financeiros, sendo ela já mãe de 12 filhos (alguns já falecidos àquela altura), e risco pela avançada idade. Com enfática recusa a um aborto, Dona Ana deu à luz Divaldo Franco.
“Divaldo copiava as lições no caderno e acordava às 4h da manhã, para estudar à luz do poste da rua e, em seguida, ir para a aula”
De infância pobre, filho de uma terna dona de casa e um rígido comerciante de fumo (que, vez em quando, trabalhava em mercearias ou retalhava carne para reforçar o orçamento), Divaldo aprendeu sobre humildade e comprometimento com o trabalho. Dada a dureza e o machismo do pai, também passou por momentos difíceis, sobretudo porque este, em vida, não aceitava a mediunidade do filho, encarando-a como alucinações ou coisas do demônio. E apanhou muito. “Se continuar com essa loucura de falar com os mortos, eu é que vou acabar te matando na chibata”. A mãe, por outro lado, ainda que analfabeta e muito católica, acalmava o filho. Pedia-lhe que ficasse calmo, que aquelas aparições deviam ocorrer por algum motivo que não cabia a ele julgar. E que, mesmo que aquilo o afastasse do Catolicismo, ele não se preocupasse. O importante era fazer o bem. O reconhecimento do pai veio depois de sua morte, quando apareceu a Divaldo, desculpando-se por sua ignorância e por tê-lo querido como o irmão, então goleiro do Bahia (depois, Bahia de Feira), o Yo-Yo. “Você não deixa de ser um goleiro. Só que um goleiro de Deus!”.
Ainda garoto, Divaldo Franco cursou a Escola Normal de Feira de Santana. Queria tornar-se professor, já que não tinha como pagar os estudos para ser médico ou padre, sua vontade inicial. Na Escola, era um dos mais aplicados. Sem luz elétrica em casa nem dinheiro para pagar as cartilhas, Divaldo copiava as lições no caderno e acordava às 4h da manhã, para estudar à luz do poste da rua e, em seguida, ir para a aula. Dono de uma determinação sem tamanho, também passou por períodos de muita perturbação espiritual, quando ainda não sabia lidar com a sua mediunidade ostensiva. O seu primeiro contato com o centro espírita veio após uma inexplicável paralisia que lhe acometeu as pernas. Acamado, recebeu a visita da espírita Ana Ribeiro Borges, levada por uma prima de Divaldo, e teve identificada a obsessão pela qual passava. Depois disso, sua própria mãe, dona Ana, forçou-o a frequentar o Centro Espírita Jesus de Nazaré. Naquele tempo, Divaldo era coroinha do Sagrado Coração de Jesus e tentou resistir à ida ao Centro, mas acabou cedendo. Lá, surpreendeu-se ao ver pessoas de respeito e, pela primeira vez, sentou-se à mesa com outros médiuns. Entrou em transe, transmitiu à mãe o recado de um de seus filhos, irmão de Divaldo, e, a partir daí, virou frequentador assíduo do Centro, mesmo sem deixar de frequentar a missa, na Igreja Matriz de Feira de Santana. Tinha apenas 17 anos. Passou a frequentar também outros centros espíritas, tornando-se palestrante em 1947, com quase 20 anos de idade.
A Mansão do Caminho
Divaldo Franco é, hoje, um dos maiores popularizadores mundiais do Espiritismo. Um dos mais completos médiuns de todos os tempos, na opinião de muitos estudiosos. Como disseminador da bondade e da caridade pura, é responsável, juntamente com Nilson Pereira (seu grande amigo de longa data), pela criação da Mansão do Caminho, obra que lhe veio através de uma revelação enquanto passava pelo bairro Pau da Lima, em Salvador, onde se situa a Mansão. Fundada em 1952, é um ambiente de reprogramação do ambiente familiar, que dá fundamental importância à educação e à saúde de milhares de crianças. Por isso, conta com creche, escolas (inclusive, com convênio estadual), centros de formação de artes e informática e demais cursos. Mais ainda, possui Centros de Parto Normal, Policlínica, Laboratório e um sem-fim de benfeitorias. A Mansão atende, hoje, cerca de 3 mil crianças, adolescentes e jovens de famílias de baixa renda, por dia, em regime de semi-internato e externato. Além disso, Divaldo é pai de 685 filhos adotivos e mais de 200 netos e bisnetos.
“Parte da sua manutenção vem da venda dos livros psicografados por Divaldo, cuja renda é integralmente doada para a Mansão do Caminho”
Traçar estas poucas linhas para falar do trabalho da Mansão é muito pouco. Pouco demais. Mesmo porque o nome já demonstra a dimensão do trabalho feito por este grande lar. Parte da sua manutenção vem da venda dos livros psicografados por Divaldo, cuja renda é integralmente doada para a Mansão do Caminho. Todo o trabalho assistencial e doutrinário feito pelo Brasil e no exterior é exercido gratuitamente. Para seus gastos pessoais e de algumas viagens, servem-lhe os recursos da sua aposentadoria como funcionário público do antigo Instituto de Previdência e Assistência dos Servidores do Estado – Ipase.
Pela sua obra e representatividade, Divaldo Franco recebeu homenagens em diversos países e cidades das Américas, Europa e África: comendas, placas, medalhas, troféus, moções, diplomas, certificados e títulos honoríficos significativos, que reúnem, em sua totalidade, mais de 700 homenagens. Mais recentemente, recebeu a visita do Comandante Geral da Polícia Militar da Bahia, o qual deixou claro o seu interesse em deixar a tradição coercitiva desta instituição, entrando em “nova ordem de contribuição em favor da paz entre as criaturas”, como bem descreveu Divaldo em sua coluna quinzenal do Jornal A Tarde.
Todos os anos, Divaldo Franco palestra em nossa cidade, na Semana Espírita de Feira de Santana. Neste ano de 2015, ano da 37ª edição, não vai ser diferente.
Abaixo, segue a programação da Semana Espírita, que ocorrerá nos dias 19 a 27 de setembro, no Ginásio do Colégio Castro Alves, e terá como tema “Construindo a consciência de Imortalidade”. Divaldo estará presente no dia 21/09, segunda-feira.
A entrada é gratuita e a ação será transmitida durante toda a semana no site da Federação Espírita Brasileira – FEB: www.febtv.com.br.