Foi grande a luta do feirense desempregado para garantir uns trocados no aguardado recesso junino. O movimento nos dias que antecederam os festejos foi vertiginoso. Quem prestou atenção viu de tudo: enxames de homens, mulheres, idosos, adolescentes, até crianças – quase todos, invariavelmente, negros ou pardos – se esforçando para vender qualquer coisa em qualquer lugar.
As opções foram vastas: o milho assado, vermelho e fumegante nos fogareiros; licores multicoloridos sobre bancas engenhosas; montes imensos de amendoim caprichosamente equilibrados sobre carrinhos de mão; os fogos que fazem a alegria de crianças e adultos e que tornam belas as noites juninas; os bolos típicos da época; lenha para as fogueiras e adereços como balões coloridos.
Essa gente se espalhou pela cidade: estavam nos caminhos enlameados do Centro de Abastecimento, disputando os espaços exíguos do centro da cidade, nas fervilhantes feiras-livres dos bairros, nas calçadas das vias comerciais dos bairros populares e até mesmo defronte de casa, inclusive naquelas ruas cujo movimento de pedestres é menos intenso.
Nas rodovias de intermináveis engarrafamentos, não faltou quem vendesse a água mineral e o refrigerante, os embrulhos pequenos de amendoim e a pamonha cozida e cheirosa. Animados motoristas paravam para comprar qualquer coisa com seus veículos abarrotados de gente e de bagagens. Houve quem dirigisse a rigor, com a cabeça devidamente ornada pelo chapéu de palha.
As chuvas que começaram a cair com mais intensidade há 15 dias devem contribuir para reduzir o preço do milho e do amendoim, consumidos com mais intensidade nessa época. Mais adiante, virá a colheita do feijão de corda, cujos preços também devem ficar mais em conta. Nesses tempos cinzentos, de desalento em relação à situação da economia, o lucro apurado vai ajudar na quitação das contas, na árdua travessia de mais alguns dias.
“O que se vê é um hipócrita jogo de empurra em que ninguém quer assumir suas responsabilidades”
O problema é que o tempo está passando e retomada econômica ninguém vê. O que se vê é um hipócrita jogo de empurra em que ninguém quer assumir suas responsabilidades: os petistas – irrefutáveis responsáveis pela eclosão da crise – tentam empurrar a fatura para o emedebê, que afundou ainda mais o País, mas que atribui os problemas que enfrentou à herança maldita petista. Um salseiro em que todos alegam inocência.
Nessa balbúrdia, Jair Bolsonaro (PSL-RJ) assumiu o governo distribuindo culpas, eximindo-se em relação ao passado – o que é óbvio – mas se omitindo em relação ao presente e sem sinalizar nada para o futuro. Para os milhões de desempregados, o passado é amargo, o presente é desalentador e o futuro, inquietante. Isso para quem consegue pensar no futuro, porque sobreviver no presente é prioridade absoluta.
Enfim, apesar da bonança circunstancial dos festejos juninos, há um longo e incerto segundo semestre pela frente. E é necessário que a economia volte a crescer, porque a bárbara precariedade que se vê pelas ruas não pode se estender por muito mais tempo. Afinal, há evidentes riscos sociais embutidos em cenários do gênero.
Foto de capa: Washington Nery/SECOM