Temperatura alta e grande fluxo de veículos. Ao parar no sinal vermelho é impossível não reclamar do calor. Para refrescar, ajuda muito beber uma água gelada, amenizando a temperatura do corpo e matando a sede. A água geladinha, um tesouro em dias quentes, não aparece do nada: há quem esteja disposto a enfrentar o asfalto quente para entregá-las no ambiente hostil do trânsito feirense.
Sozinhos ou em grupo, os vendedores dos semáforos feirenses andam em corredores de carros, motos e ônibus para vender seus produtos. Água mineral, água de coco, doces, panos de prato, carregadores, borrachas de para-brisa e outros itens. Levam seus materiais em pequenos carrinhos, que ficam em um ponto da calçada, próximo à faixa de trânsito para melhorar o trabalho de reposição.
Os vendedores de Água
Cada vendedor de água tem seu isopor, ajudando a manter a temperatura do produto. Eles levam nas mãos cinco garrafinhas de 500ml, seguradas habilmente, para retornar ao isopor somente após todas estarem vendidas. Ao sinal vermelho, vendem de duas a três garrafinhas.
O calor desafia a resistência de quem vende, mas ajuda ao aumentar a sede dos condutores, garantindo mais clientes. Alguns tem seus meios de proteção contra a radiação solar, outros se vestem de maneira simples. Muitos usam chapéu para proteger o rosto, camisa de manga longa para proteção dos braços, calça e protetor solar para enfrentar o dia. Pochete na cintura para guardar os documentos e o dinheiro gerado no trabalho.
Não há descanso em um semáforo de grande movimentação. Eles anunciam o produto em falas repetitivas: “Olha a água! Olha a água! Olha a água!”.
Homens, mulheres e até mesmo crianças fazem esse trabalho. Muitos afirmam que, por não haver emprego suficiente, encontraram essa ocupação. Alguns não querem trabalhar recebendo ordens de outras pessoas, e resolvem fazer da rua seu próprio ambiente de serviço.
“Ele garante que está muito melhor do que num emprego fixo, pois não se sente bem recebendo ordens de um chefe.”
Cristiano Santana vende água há seis meses na Avenida Barão do Rio Branco, trabalhando de oito da manhã às quinze da tarde. De segunda a sábado. Costuma ter uma renda de mil reais ou mais por mês. Escolheu esse trabalho, segundo ele, por falta de opção: “É por causa do desemprego, pra não ficar sem fazer nada, a única opção que eu tive foi trabalhar no sinal.”
Ele sustenta a família com essa atividade, e sente-se satisfeito por estar trabalhando nesse ambiente, mesmo com as dificuldades. Sem formação escolar e sem cursos que o qualificasse em algo, a busca por trabalho ficou difícil, mas consegue ganhar mais que um salário mínimo: “Minha rotina é normal, é como se eu estivesse trabalhando fixo”, diz ele.
José Silva é estudante, e faz vendas nas ruas há cerca de dois anos. Para se proteger do sol, usa um chapéu de palha e protetor solar. Fica em média 6 horas por dia nas ruas vendendo água. Para manter o pique, criou o hábito de se alimentar bem e dormir cerca de oito horas por dia, o descanso para resistir ao trabalho árduo.
“A questão é, eu costumo me alimentar direitinho, ter uma boa alimentação. É como eu descanso para ter resistência para vender neste sol”. Ele garante que está muito melhor do que num emprego fixo, pois não se sente bem recebendo ordens de um chefe. O que pretende fazer no futuro? “Estudar para ingressar em uma universidade”.
A vendedora de doces
Selma, como é chamada, veio de Fortaleza com sua família para conseguir um bom emprego. Cuida dos quatro filhos sozinha, mas já está há um ano e meio na cidade e ainda não conseguiu trabalho. Para sustentar os filhos, resolveu vender doces na sinaleira. De real em real ela consegue o pão do dia. A filha mais velha, aparentando ter dezesseis anos, ajuda em outra parte da avenida. Enquanto estão vendendo os doces, os mais novos brincam na calçada – Dona Selma sempre de olho neles. A saudade da terra natal traz esperança de algo melhor: ela não descarta encontrar uma boa oportunidade.
“O pai não está aqui para ajudar. Eu sou sozinha para cuidar desses meninos, e o jeito é este mesmo.”
“Estou fazendo isso aqui para não ficar parada. Se eu ficar parada eu e meus filhos morremos de fome. O pai não está aqui para ajudar. Eu sou sozinha para cuidar desses meninos, e o jeito é este mesmo. Mas não nego um emprego. Só não estou em um porque não achei. Ainda procuro…”.
O vendedor de bolsas
Antônio Nogueira vende mochilas e bolsas de viagem há cinco anos. Não é de fazer anúncio do seu produto, como outros vendedores, porém, seu negócio rende bem, chamando a atenção dos clientes ao passarem na avenida. Ele mesmo fabrica seus produtos, que custam entre R$15,00 e R$30,00 reais. Diariamente chega a ganhar R$150,00 reais.
Tudo começou há vinte anos, quando iniciou o aprendizado em costura de bolsas. Ele foi selecionado para trabalhar em uma fábrica. Daí comprou sua própria máquina de costura e em casa resolveu fabricar os produtos. “Comecei costurando, depois comprei minha máquina de costura e faço minhas próprias mochilas e costuro até hoje”. Pela manhã vende as mochilas, e à tarde fabrica, junto com seu filho. Todos os dias vive essa rotina, menos aos domingos.
Trabalhar em semáforos foi a escolha que alguns feirenses fizeram para se manter. Dividindo espaço com os carros, cronometrando o tempo de cada sinal parado, tentando vender o mais rápido possível. Comprando seus produtos por um preço mais em conta para revender nas ruas, todos os dias têm a expectativa de voltar com a caixa ou o carrinho vazio, e a satisfação de ter conseguido vender tudo, garantindo combustível para a sobrevivência em nossa cidade-feira.