Nenhum político feirense se manifestou contra o bojudo reajuste que a Câmara Municipal se concedeu e concedeu aos secretários municipais e ao prefeito. A medida, aprovada em definitivo no dia 25 de junho (terça), por unanimidade dos vereadores presentes, vale a partir de 2021. Em janeiro daquele ano, o chefe do Executivo vai beliscar um contracheque de R$ 26 mil – o salário atual é de R$ 18 mil – e vereadores e secretários mordiscarão holerites mais modestos, mas muito apetitosos: R$ 18,9 mil, frente aos atuais R$ 15 mil.
Até dezembro de 2012 um vereador feirense ganhava exatos R$ 9.280. Naquele ano veio um grande rompante de generosidade: o salário das excelências na legislatura seguinte saltou para R$ 15.031,76. Reajuste generoso: 61,9%, maior que qualquer reposição inflacionária sensata. Trabalhador nenhum costuma ser agraciado com aumento do gênero.
Não é preciso ser nenhum gênio das finanças para descobrir que, mesmo em plena crise econômica, ser vereador em Feira de Santana é ofício rendoso. Caso o salário em dezembro de 2012 – aqueles R$ 9.280 – fosse reajustado com base no Índice de Preços ao Consumidor Amplo, o IPCA, até maio de 2019 estaria em R$ 13.536,91. Abaixo, portanto, dos R$ 15 mil atuais.
Noutras palavras, enquanto o feirense está aí desempregado, subempregado, na informalidade, aceitando receber menos para se manter no trabalho, a classe política feirense acumula ganhos salariais bem acima da inflação no meio de uma crise terrível. E – repita-se – ninguém que milita na política local reclamou da medida, adotada durante o recesso junino e bem antes das eleições, para não causar reações.
“Isso para conceder comendas, honrarias, celebrar efemérides, bajular o prefeito de plantão e ignorar os problemas que afligem os feirenses”
Para arrematar, não custa lembrar que o rendimento médio do trabalhador fica bem abaixo desses valores. Usando dados do Censo 2010 do IBGE – corrigidos pelo IPCA e desconsiderando toda a eventual flutuação nos rendimentos no período – têm-se uma noção da terrível disparidade.
Quem labuta na informalidade embolsa, na média, R$ 930,83; quem tem a carteira assinada é mais feliz: recebe R$ 1.582,58; já os batalhadores por conta própria não vão além dos R$ 1.692,72; os barnabés do serviço público – cuja escolaridade é superior à da média da população – recebem, em média, R$ 3.319,90.
Tudo bem abaixo dos reluzentes salários que a classe política se autoconcedeu, com vigência a partir de 2021. Isso para conceder comendas, honrarias, celebrar efemérides, bajular o prefeito de plantão e ignorar os problemas que afligem os feirenses. É claro que há as exceções de praxe no Legislativo, que apenas confirmam a regra.
De qualquer maneira, nada justifica a generosidade, menos ainda a falácia de que não estão legislando em causa própria. A medida também ajuda a alimentar o discurso perigoso dos trogloditas que defendem a supressão do Legislativo para extinguir privilégios. Ou algum ingênuo acha que a câmara feirense atravessaria, incólume, um surto autoritário no País?