Um dos assuntos mais discutidos atualmente são as manobras feitas pelos políticos da nossa República com os chamados “laranjas”, pessoas designadas para assumir a responsabilidade de algum ato que se configure ilegal, caso o verdadeiro responsável pelo ato seja identificado. A pauta está gerando intrigas, desavenças e rancores, já que, tão pouco tempo há de eleitos nossos representantes, e já se vê imbróglios frutíferos de tanta repercussão. Mas nada que possa ser considerado grande catástrofe nacional, pois, como disse nosso representante em Davos, “pela primeira vez no Brasil um presidente montou uma equipe de ministros qualificados”, inspirando-nos confiança e serenidade com o futuro da Pátria Amada.

Em Feira, o furor em torno dessa estória de laranjas é grande, a ponto de deixar alguns cidadãos extremamente desconfortáveis, e até raivosos. Luís Bagaço, vendedor de laranjas no Centro de Abastecimento, é um dos que não aguenta mais ser chamado de “Queiroz” pelos colegas de ofício – vendedores de outras frutas e verduras, naturalmente. Em um desses dias, rumou um murro à cara de Pelezinho da Melancia, que teve a sorte de desviar a tempo. Tudo porque Pelezinho descobriu um cliente de Bagaço chamado Flávio, reagindo com uma gargalhada à coincidência e dizendo que “agora tinha entendido a laranjada”.

Há também o caso de seu Patusco, tradicional bodegueiro do Centro, vendedor de infusões, cachaças e raízes. Um dos seus clientes, após três doses de cassutinga, fez grave denúncia contra o comerciante, segundo a qual tinha contratado laranjas para a aquisição de alguns produtos na farmácia da ladeira. Quem presenciou a cena viu o velho Patusco ficar vermelho e ofegante, indignado com a acusação irresponsável, sem provas, criando uma mácula na reputação de quem sempre se comportou com probidade e retidão.

Após alguns interrogatórios e picuinhas, porém, ficou claro do que se tratava. Seu Patusco, depois de 70 anos bem vividos, viúvo duas vezes, continuava bom namorador e galanteador, mas, acima de tudo, prevenido. Para não ser flagrado comprando preservativos na farmácia, semanalmente mandava jovens emissários cumprirem a tarefa, sob propina de 30% do valor total dos preservativos adquiridos – diz-se a boca pequena que a quantidade variava entre cinco e oito camisinhas por semana.

Há investigações no sentido de comprovar a aquisição de medicamentos estimulantes e fortalecedores de tamanha libido, mas nada que tenha sido confirmado, nem descartado. Outros acham exagerada a acusação, e atribuem tal disposição à combinação de algumas fôia pôde vendidas na própria bodega.

O fato é que, no fim das contas, a utilização de laranjas beneficia quem esconde certas espertezas, porque, até que tudo seja comprovado o disse-me-disse vai permitindo diluir a responsabilidade, criando uma cortina de fumaça que ilude pelo menos os mais benevolentes. No caso específico de Seu Patusco, perguntado por amigos íntimos sobre a veracidade da denúncia, obtém-se como resposta o seguinte aforismo: “a reputação de um homem é construída com base naquilo que não sabem dele”.

Mas isso sou eu quem está dizendo. Prova, mesmo, não foi encontrada nenhuma.